KAM - Aliando a gestão de Key Accounts (KAM) ao Revenue Management

A tradicional técnica de gestão de contas-chave pode (e deve) ser utilizada dentro um programa de Revenue Growth Management, rentabilizando o negócio. 

Um dos erros mais comuns quando falamos de Revenue Growth Management (RGM) é o de confundirmos esse conceito com o de pricing. De fato, em temas ligados à precificação geralmente residem as maiores oportunidades de se alavancar faturamento e rentabilidade em negócios mais maduros. Mas Revenue Management é muito mais do que tratar de preços.  De acordo com a consultoria McKinsey & Company, RGM é “a disciplina de dirigir um crescimento lucrativo e sustentável a partir da sua base de clientes e através de um sortimento de estratégias relativas a sortimento, promoções, gestão do trade e pricing.” Também o autor Ronald J. Huefner, em Revenue Management: A Path to Increased Profits (2011), trata o tema de maneira semelhante, quando aponta que “revenue management engloba pricing diferenciado e outras técnicas para influenciar a demanda dos clientes por produtos e serviços da organização.” 

Uma técnica muito popular de gestão da carteira de clientes é o Key Account Management, ou simplesmente KAM. Ela consiste basicamente em trabalhar os principais clientes da carteira de maneira diferenciada, em função de sua importância ao negócio. O objetivo é gerar valor a esses clientes, de modo a receber benefícios em troca. Isso já é praticado por empresas de produtos de consumo massivo (FMCG) há mais de 40 anos no Brasil. O que muitas organizações não se atentam, contudo, é que a prática da gestão de Key Accounts (KAM) pode (e deve) ser integrada a outras técnicas de Revenue Growth Management (RGM), buscando uma melhor rentabilidade global de suas contas, através dos volumes potenciais gerados, de um mix de canais otimizado e do papel de alguns clientes no estabelecimento de preços referenciais no mercado (ancoragem). 

Clientes grandes e clientes rentáveis 

Empresas que trabalham com KAM costumam definir suas contas-chave a partir da importância que os diversos clientes possuem para elas, tanto no momento de análise quanto em potencial futuro. E essa importância quase sempre é medida em faturamento ou volume de vendas. Bem, ninguém discute que isso faça total sentido, e quase sempre deva ser um critério de segmentação relevante. Mas é uma visão incompleta. Existem diversos outros fatores que podem contribuir para um cliente específico ser considerado uma conta-chave, como sua importância política em uma determinada região (importante no agronegócio), seu acesso a informações do setor ou mesmo o prestígio que gera. Afinal de contas, quem não quer fornecer produtos e serviços para um cliente como a Novartis, o Starbucks ou a Cargill? Fornecer a clientes desse nível é um atestado implícito de alta qualidade e de idoneidade. 

Clientes grandes sabem de sua importância e se utilizam disso. Seu poder de barganha costuma ser enorme em negociações com os fornecedores, pois conhecem o impacto de suas compras nos negócios desses últimos. Tomemos alguns exemplos no setor do varejo. Segundo a consultoria Statista, somente três redes britânicas (Tesco, Sainsbury’s e Asda) possuíam juntas em abril passado 56,4% de market share do varejo supermercadista do Reino Unido. Uma enorme concentração do setor. No Brasil, a situação em supermercados é menos dramática do que lá. Segundo o Ranking ABRAS 2022, as três principais redes (Carrefour, Assaí e GPA) concentravam 25,5% do faturamento supermercadista.  Mesmo assim uma participação considerável, ainda mais se abrirmos esses números em uma visão regional, onde as concentrações chegam a ser bem maiores. Ficar de fora de uma dessas redes significaria dificilmente atingir o potencial de vendas. E as redes se utilizam dessa posição de mercado e exigem descontos e outros termos comerciais que lhe sejam favoráveis, reduzindo os lucros de fornecedores. A estes é dada a opção de abrir mão de um maior lucro em função do cumprimento de objetivos de vendas. Em alguns casos, isso pode até mesmo significar prejuízo.  

Mas, se as vendas a contas-chave em geral implicam em menores margens em produtos e serviços, como trabalhar com o KAM em prol do RGM? A resposta a isso é a que devemos maximizar a rentabilidade total do negócio, através da melhor combinação entre margens de contribuição individuais e volumes de vendas. No RGM é essencial que saibamos as margens geradas nos clientes e, a partir daí, tomar decisões sobre atividades que permitirão aumentar a margem global dentro deles, ainda que por produto ou serviço sejam reduzidas. Margens individuais de produtos e serviços são muito importantes, mas apenas uma parte da equação. O que interessa mesmo, no final das contas, é quanto de rentabilidade a conta-chave irá trazer ao negócio como um todo. Se um cliente do KAM gera, por exemplo, R$ 1 milhão de rentabilidade por mês, mas através da diminuição de preços (e consequente perda de margem individual nos produtos) os volumes crescerem de tal forma que a rentabilidade total passe a R$ 1,2 milhão, bingo! O RGM está sendo bem feito. Mas claro que isso é somente um exemplo hiper simplificado. Todas as consequências da atividade deverão ser analisadas, inclusive a reação dos seus concorrentes e os demais impactos possíveis, inclusive na imagem de marca no médio e longo prazo.   

JBP e ABM são sempre possibilidades 

JBP (Joint Business Plan) e ABM (AccountBased Marketing) são formas avançadas de se trabalhar o KAM. A primeira trata de cocriar estratégias junto às principais contas chave, enquanto a segunda visa tratar alguns poucos clientes como mercados em si mesmos, tal a importância deles para o seu negócio. Fornecedor e cliente trabalhando com um maior nível de integração estratégica através de equipes multi ou interdisciplinares facilitam aos gestores encontrar novas oportunidades de negócios e, com isso, ampliar os ganhos através de RGM. Mas são programas que podem ser direcionados a pouquíssimos parceiros. A grande maioria das contas chave deve mesmo ser tratada com ferramentas e técnicas tradicionais de KAM, que buscam a criação de valor através do estabelecimento de relacionamentos que sejam estratégicos, rentáveis e duradouros. 

Abandonamos os demais clientes? 

Para otimizar a sua rentabilidade, empresas fornecedoras devem equilibrar seus diferentes canais de distribuição. Isso significa que a opção por se implementar um programa de KAM não significa abandonar os demais canais. Aliás, muito pelo contrário. Ainda que representem individualmente volumes menores, no conjunto os clientes que não fazem parte do KAM podem ser muito significativos para o faturamento geral da empresa. E até mesmo de sua rentabilidade. Claro que para vender e distribuir em clientes pequenos o custo poderá ser alto, mas para uma análise mais completa de RGM deve-se levar em conta também a possibilidade de uma gestão do pricing mais rentável do que seria possível em contas-chave. E isso devido ao menor poder de barganha dos clientes não tão grandes. 

RGM é muito mais do que pricing, é a busca de uma rentabilidade maior e sustentável. KAM busca gerar valor em clientes especiais e, com isso, maximizar negócios neles. Aliar o KAM ao RGM de maneira programática e inteligente, dessa forma, só poderá mesmo trazer uma melhor rentabilidade global à empresa.

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FONTES 
ABRAS. “Ranking ABRAS 2022.” Superhiper n°547, ano 48 (maio 2022): 94-99. 
Cross, Robert G. Revenue Management – Hard-core Tactics for Market Domination. New York, NY: Broadway Books, 1997. 
Huefner, Ronald J. Revenue Management – a Path to Increased Profits. 2a ed. New York, NY: Business Expert, 2015. 
Revista Forbes, 16 de agosto de 2021. 
Statista. “Market Share of Grocery Stores.” Retail & Trade/ Food & Beverage (03 maio 2022). https://www.statista.com/statistics/280208/grocery-market-share-in-the-united-kingdom-uk/ (acessado em 17 de junho de 2022.


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